segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

QUER PUBLICAR?!

COLETÂNEA "TANTAS PALAVRAS..."
O que é?
Uma coletânea de textos de autores diversos, a partir dos gêneros contos e crônicas, com temática livre.
Quem pode participar?
Qualquer escritor, quer tenha ou não outros livros publicados. Aliás, a coletânea cumpre dois objetivos: (1º) divulgar textos literários de qualidade na forma impressa e (2º) oportunizar àqueles escritores que não têm condições de publicar uma obra solo, mas que querem ver seus textos impressos em forma de livro.
Qual o formato dos textos?
Os textos devem ser crônicas ou contos (em prosa, portanto), entre 2000 e 2500 caracteres, já contando com espaços (é preciso que se respeite esse número), em fonte Times New Roman, 12. Breve rodapé com currículo do escritor (máximo três linhas, sem foto).
Qual o valor do investimento?
Cada escritor poderá publicar um texto, no valor de R$ 50,00 (cinquenta reais), com direito a dois livros, (formato 18x25cm, capa colorida, miolo 1 cor).
Como devo proceder?
Os escritores interessados deverão encaminhar o texto para aluceni@hotmail.com, de acordo com os critérios propostos acima, até 30 de março de 2011 (prazo máximo para realizar o pagamento da participação). Caso resida fora de Araçatuba e queira participar, solicitar número de conta bancária para efetuar o depósito.
PARTICIPE E AJUDE DIVULGANDO!
Antonio Luceni
Coordenador Regional da UBE

domingo, 30 de janeiro de 2011

QUER GANHAR 2 LIVROS?

OS LIVROS DESTA SEMANA SERÃO PRESENTEADOS AO QUE CRIAR A
FRASE MAIS CRIATIVA.

A PROPOSTA É A SEGUINTE: AO INVÉS DE "ORDEM E PROGRESSO" NA BANDEIRA BRASILEIRA, QUAL FRASE VOCÊ COLOCARIA?

O AUTOR DA MELHOR FRASE IRÁ GANHAR 02 LIVROS:

"OUTROS OLHARES" e "JÚLIA À PROCURA DA CONSCIÊNCIA PERDIDA"
ANTONIO LUCENI



ATENÇÃO, INSIRA A FRASE NOS "COMENTÁRIOS" E NÃO SE ESQUEÇA

DE COLOCAR O SEU NOME COMPLETO E E-MAIL PARA CONTATO. VOCÊ TAMBÉM DEVERÁ SER UM SEGUIDOR DESTE BLOG.

O VENCEDOR SERÁ ANUNCIADO NA SEXTA-FEIRA, 04/02.
BOA SORTE E ATÉ LÁ!

INDIQUE AMIGOS PARA SEGUIR ESTE BLOG E GANHE LIVROS!

PARA O BEM DE TODOS NÓS

Antonio Luceni
aluceni@hotmail.com

Existe um filme, prezado leitor, chamado Perfume: a história de um assassino, do diretor Tom Tikwer, de 2006, a partir do qual tomo uma cena. O filme é iniciado com uma daquelas imagens medievais, com cenário cinza, meio lúgubre, numa feira de peixes (observe que tipo de “odor” costurará o filme).
Em meio à venda de peixes, uma mulher entra em trabalho de parto e, como de costume naquele contexto, agacha-se e pari a cria ali mesmo, na sarjeta insalubre, junto com tantos outros lixos, pois assim o rebento era considerado. O menino é salvo pelo grito. Um grito de choro que faz despertar a condolência de um transeunte. A mãe vai à forca e o recém nascido, Jean-Baptiste Grenouille, vai para uma espécie de orfanato, mas de escravos mirins. Daí pra frente, quem se interessar, veja o filme.
Quis retomar e descrever esta cena porque, guardadas as proporções, ainda há rebentos sendo tratados como lixo diariamente no mundo. Ainda me chocam cenas – como a denunciada nesta semana em Araçatuba, em que uma garotinha de apenas quatro anos foi morta à paulada – em que crianças ficam à mercê da própria sorte.
Ainda me entristece, por mais bem intencionados que sejam, a criação de estatutos de defesa disso ou daquilo. Ora, pra que os estatutos são feitos? Pra que as leis de defesa de minorias são criadas? Por que em pleno século 21, em um País que tem a pretensão de ser a quinta potência mundial, necessitamos de leis que protejam nossas crianças, idosos, negros, homossexuais, mulheres...?
O que adianta ser um País de “primeiro escalão” financeiro, se estamos ainda afundados nas mais grotescas e primitivas relações humanas? Há que se pensar num ranking mais coerente que leve em conta tanto o progresso econômico quanto humano. Aliás, o primeiro, a meu ver, deve estar subordinado ao segundo, que é mais importante.
E estas questões todas passam pelo crivo político. Só se é capaz de humanizar gente com educação e cultura, não há outra forma, com justiça social, portanto. E isso tem que sair do discurso apologético e ir para uma prática urgente e eficiente.
Tantos falam da importância da Educação. Tantos acham cultura um negócio lindo. Todos querem ver o País crescer. Mas o que, na prática, temos feito para isso? Quais são as reais ações que nos fazem acreditar que isso será possível?
Enquanto isso o mundo gira, o pulso, ainda pulsa e, infelizmente, passamos a ver com tanta frequência a violência em nossas vidas (pela televisão, rádio, jornais, revistas e internet) que fica a sensação de que ela é necessária, de que em sociedade “é assim mesmo”, que é normal.
Não, não é normal. Não, não devemos nos conformar. Sim, é preciso mudar. Para o bem de nossas crianças, para o bem de nossos velhos, para que a diferença seja aplaudida ao invés do monótono e uníssono som das coisas. É preciso que entremos numa sintonia diferente da que estamos vivendo, para o bem de todos nós.

Antonio Luceni é mestre em Letras e escritor, Coordenador Regional do Núcleo UBE Araçatuba e Região.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

JÁ TEMOS UMA GANHADORA DO LIVRO!

LÍVIA JACOB VEIGA

PARABÉNS...

Gostaria de agradecer também à Rosana Costa Andrade, Andréa Bretones dos Santos, Edma, Maria Iolanda Silva e Anselmo Dequero porque ficaram muito próximos de ganhar.

NA PRÓXIMA SEMANA SERÃO POSTADOS MAIS DOIS LIVROS!!!

Quem será que irá ganhar?!

DIVULGUEM A PROMOÇÃO PARA SEUS CONTATOS.

"INDIQUE AMIGOS E GANHE LIVROS!"

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

QUER GANHAR UM LIVRO?

VOCÊ QUER GANHAR UM LIVRO?
INDIQUE 05 AMIGOS PARA SEGUIR ESTE BLOG.

NÃO É PRECISO TER BLOG PARA SEGUIR. BASTA TER E-MAIL. CLIQUE EM "SEGUIR" E VEJA COMO É FÁCIL!
Peça QUE SIGAM ESTE BLOG e que encaminhem os nomes DELES (ou o nome que aparece na imagem) para o e-mail: aluceni@hotmail.com falando que você os indicou e PRONTO! É só retirar o livro. (Se você for de outra cidade encaminharemos o exemplar para você).

MAS ATENÇÃO, NÃO É SORTEIO: o exemplar será do primeiro que atingir a meta de 05 (cinco) indicações.

A CADA SEMANA SERÁ UM NOVO LIVRO. FIQUE ATENTO!


O LIVRO DESTA SEMANA É DO POETA EDSON GENARO MACIEL
COLECIONADOR DE LÁGRIMAS (Poemas)

domingo, 23 de janeiro de 2011

457

Antonio Luceni

Devia ter uns 6 ou 7 anos quando fui para lá. 6 anos, isso, eram 6 porque meu irmão mais novo, o Lucivan, era bebê ainda. Fomos morar, como muitos nordestinos, na periferia da cidade, nos fundos da casa de um tio meu, num casebre minúsculo de dois cômodos e um banheiro. Imaginem só: uma família de sete pessoas, com cinco crianças, morando num aperto de 3 metros por 8. Era uma prisão horrorosa.
Éramos livres aos finais de semana, como prisioneiros em condicional. Íamos para casa de outros parentes que, assim como nós, tinham seus gestos emoldurados e contidos também por margens geográficoarquitetônicas. Liberdade, então, era apenas no percurso, feito em sua maioria a pé, já que o dinheiro do ônibus era para ser economizado.
Quando começamos a estudar, nosso quintal era o pátio da escola. Corríamos feito loucos para lá e para cá. E sempre tinha uma inspetora ou até mesmo uma servente ou zelador para tolher nossos voos: “Parem de correr seus pestinhas”.
Mas a verdade é que não consigo me desligar dela. Por mais preso que fôssemos, por mais precariedade que sofremos (e não foram poucas), não sei, alguma coisa de mágico sempre me atraiu para ela. Talvez suas próprias dimensões emanassem essa sensação de liberdade, ou ao menos a possibilidade para tal.
Lembro-me de uma situação, que hoje me causa riso ao revivê-la, em que num dos poucos e raros dias de passeio mais distante de casa, meu pai nos levou a brincar num parque. Na minha memória de infância havíamos subido em uma escada enorme, com infinitos degraus, povoando meus sonhos três por quatro. Hoje, quando volto para lá, rio sozinho: não passa de 3 metros! (A verdade é que sempre fui baixo demais!).
Nas minhas idas e vindas ao longo destes anos, cada vez que estou por lá é uma alegria renovada: gente nova, lugares novos, sempre em obras, como se vivesse numa espiral infindável (acho que isso é pleonasmo!) de se renovar sempre. A ideia de estar numa fila qualquer e ouvir gente falando em francês, inglês, alemão e tantas outras línguas que nem sei distinguir nacionalidade, é divina. Um mundo inteiro em um só lugar: nas comidas, no jeito de se vestir e postar, na arquitetura, no mendigo e crianças cheirando cola, nas piadas de feirantes e ambulantes, e nos blindados e grifes caras...
São Paulo é múltipla e, por isso, aceita a diversidade. Há quem fale mal dela, há quem a apedreje, há quem reclame de seus barulhos e vai-e-vem hipnotizante e cambaleante, mas a verdade é uma só: é o coração do Brasil. Este final de ano estava em Minas e, por conta das chuvas e enchentes que ocorrem nos dois estados, quase não encontrávamos nada de carnes e hortaliças nos mercados mineiros. “Por que tá tão ruim assim pra comprar?”, foi a pergunta. “É que os caminhões de São Paulo estão atrasados, moço.”, respondeu o açougueiro.
Não tenho terra a que me apegue. Já me defini muitas vezes como “vira-lata”. De nascimento sou nordestino, fui criado na capital, estudei e trabalho no interior de São Paulo e do Mato Grosso do Sul, portanto não crio raízes. Mas se tivesse que eleger um lugar onde plantaria meu umbigo certamente seria São Paulo.
Nesses 457 anos de existência já devo ter repetido seu nome, pelo menos, umas 457 vezes.

Antonio Luceni é escritor e Coordenador Regional da União Brasileira de Escritores – UBE.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

HOMENAGEM DA MINHA AMIGA SALETE MARINI

Recebi esta homenagem da poeta Salete Marini (http://www.blogandonasala.blogspot.com/). Gostaria de partilhá-la com vocês. Obrigadão, amiga.

PALAVRAS... QUE ESTRANHA POTÊNCIA, A VOSSA!

Antonio Luceni dos Santos

Mestre em Letras – UFMS

Coordenador Regional da UBE Araçatuba e região

e-mail: aluceni@hotmail.com



Resumo

O presente trabalho pretende refletir sobre a relação que nós mantemos com a palavras em nosso cotidiano, sobretudo trazendo para discussão e prática uma relação mais harmônica e profícua com ela. Nesse sentido, buscaremos retomar vivências tanto de professores quanto de alunos como forma de (re)direcionar nossas leituras, a saber, com textos estéticos. Por meio das questões/provocações pretendemos, neste artigo, pensar nossas experiências com o texto literário como um dos elementos de alívio das tensões do cotidiano escolar.

Palavras-chave: Palavras, literatura, antologia, cotidiano, provocações.

1 INTRODUÇÃO

Tudo que pensamos, imaginamos, projetamos e fazemos é por meio da palavra. Nosso pensamento não é feito de uma substância mágica que de modo também sobrenatural é encaminhado. Não. Antes, tudo que realizamos é por meio da palavra.

Quando falamos (palavras): “Como é fulano?”, obtemos como resposta (palavras), por exemplo: “Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá ideia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros, mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me.”2

Se quisermos retomar o passado e vivenciar este ou aquele momento de nossa vida iremos fazê-lo por meio da palavra: “Oh! que saudades que eu tenho / Da aurora da minha vida / Da minha infância querida / Que os anos não trazem mais!"3.

Do mesmo modo, todos nossos planos futuros estão sob o domínio da palavra: “Vou-me embora pra Pasárgada/ Lá sou amigo do rei/ Lá tenho a mulher que eu quero/ Na cama que escolherei”4.

As grandes e pequenas histórias da humanidade estão registradas por meio da palavra: O Pentateuco, atribuído a Moisés; Ilíada e Odisseia, de Homero; Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões e Macunaíma, de Mário de Andrade são alguns exemplos de (auto)identificação do povo por meio de seu repertório escrito e, especificamente nos casos ilustrados acima, estéticos, de ficção.

Tendo em vista o exposto antes e acreditando que nossa autoimagem é constituída, em partes, pela relação que mantemos com as palavras, algumas questões são necessárias. A primeira e mais óbvia é: a) Quais palavras fazem parte de nosso repertório enquanto educadores? Depois, fazendo um recorte para sala de aula: b) Quais palavras fazem parte do repertório de nossos alunos? E, por último, (mas não a última): c) Quais provocações a escola pode fazer para que tanto professores quanto alunos sejam “formados” por um melhor repertório de palavras? Fiquemos nestas questões.

2 Quais palavras fazem parte do nosso repertório?

Quando nos referimos a “nosso repertório” estamos pensando na perspectiva de educadores e de adultos que somos. Nesse sentido, também gostaríamos que as reflexões proposta aqui caminhassem nesta perspectiva: a de educadores e adultos.

Educadores retomando a nossa própria formação, as experiências que tivemos com leitura e com o livro, os autores e obras que conhecemos, os livros de que mais gostamos, aqueles que mexeram conosco, que nos pegaram no primeiro parágrafo...

Educadores a partir de nossas leituras diárias, as palavras com as quais nos identificamos diariamente, quais elegemos para fazerem parte de nosso vocabulário, do nosso “falar difícil” em reuniões pedagógicas, em palestras e aulas ministradas etc.

Educadores e nossa formação continuada, nos grupos de estudos que frequentamos, nos cursos de especialização, mestrado, doutorado etc. que temos feito ou com pretensão de fazer.

Educadores que têm um repertório de vida e de palavras mais amadurecido, mais adequado para cada uma das situações e que fazem uso da linguagem (principalmente da verbal oral e escrita e em Língua Portuguesa) de forma consciente, intencional...

Trazemos, nesse momento, a reflexão de Jorge Larrosa Bondía, quando diz:

As palavras produzem sentido, criam realidade e (...) funcionam como potentes mecanismos de subjetivação. Eu creio no poder das palavras, na força das palavras, creio que fazemos coisas com as palavras e, também, que as palavras fazem coisas conosco. As palavras determinam nosso pensamento porque não pensamos com pensamentos, mas com palavras, não pensamos a partir de uma suposta genialidade ou inteligência, mas a partir de nossas palavras. E pensar não é somente “racionar” ou “calcular” ou “argumentar”, como nos tem sido ensinado algumas vezes, mas é sobretudo dar sentido ao que somos e ao que nos acontece. E isto, o sentido ou o sem-sentido é algo que tem a ver com nossas palavras. E, portanto, também tem a ver com as palavras o modo como nos colocamos diante de nós mesmos, diante dos outros e diante do mundo em que vivemos. E o modo como agimos em relação a tudo isso. BONDÍA, (1999).

Concordamos inteiramente com ele porque também acreditamos no poder transformador da palavra. E não estamos tratando de nenhuma seita ou conceito transcendental, não. Estamos tratando aqui do sentido prático da linguagem. Daquela carga semântica que é atribuída a cada uma das palavras conforme a relação que cada falando, de cada povo e cultura, depositou nela através dos séculos e séculos. Por essa razão quando dizemos para alguém “Eu te amo” isso deve estar cheio de sentido de verdade; quando falamos “Deus o abençoe” que seja tudo isso que entendemos e desejamos por “Deus” e “benção”; assim como quando pensarmos em “desgraçado” ou “amaldiçoado” compreendamos, antes, que sentimentos e sensações estas palavras despertarão no atingido por elas.

O que é mais gostoso ouvir?:

“Amor: 1. afeição profunda; 2. objeto dessa afeição; 3. Conjuntos de fenômenos cerebrais e afetivos que constituem o instinto sexual; 4. Coisa ou pessoa bonita, preciosa; 5. Afeto a pessoa ou coisa; 6. Relação amorosa; 7. Entusiasmo, paixão; 8. Inclinação sexual forte por outra pessoa; 9. A pessoa amada; 10. Cobiça; 11. Veneração; 12. Caridade.” (RIOS, 1999).

Ou:

“Amor é fogo que arde sem se ver,/ é ferida que dói, e não se sente;/ é um contentamento descontente,/ é dor que desatina sem doer./ É um não querer mais que bem querer;/ é um andar solitário / entre a gente;/ é nunca contentar-se de contente;/ é um cuidar que ganha em se perder./ É querer estar preso por vontade;/ é servir a quem vence, o vencedor;/ é ter com quem nos mata, lealdade./ Mas como causar pode seu favor/ nos corações humanos amizade,/ se tão contrário a si é o mesmo Amor?” ?(CAMÕES, 2004).

Não gostaríamos de direcionar as respostas, mas certamente o segundo texto é muito mais atrativo. E o interessante é que em ambos os casos o objeto de discussão é o AMOR. É bem verdade que necessitamos dos dois textos. Não cabe aqui excluir um e deixar com que o outro “reine soberanamente” em nossas mentes ou de nossas crianças e adolescentes. Por isso mesmo, o contrário também vale. Por vezes aplicamos uma “overdose” de textos técnicos em nossas salas de aula e o texto estético, de ficção, a poesia... aparecem como “perfumaria”, “pano-de-fundo” para uma “grandeloquente estrela”, personagem principal.

Então, quais palavras fazem parte de seu repertório? Como você se relaciona com as palavras diariamente? Seu vocabulário é um “quase-robô” (com palavras “secas”, mecânicas, pobres de significados...) ou é um solo fértil em que há possibilidades de sensações e significados? Precisamos “engravidar”5 as palavras...

2 Quais palavras fazem parte do repertório de nossos alunos?

É a outra ponta, não é mesmo? A sala de aula é feita, principalmente, por esta alquimia: professor e aluno. É dessa relação que as coisas acontecem (para o bem ou para o mal). É para esta relação que está dedicada a maior parte da carga horária dos 200 dias letivos, das pontes e feriados (ou você não corrige provas e prepara atividades nesses dias?!), das comemorações e festas escolares... Então, é esta relação de pessoas-palavras que merece as atenções, as leituras, as palavras...

É lógico que não devemos generalizar. Também não temos nenhuma base científica para afirmar categoricamente o que vamos dizer. Mas partindo da experiência que temos em sala de aula e também de depoimentos que ouvimos, lemos e vemos diariamente por meio de jornais, revistas, blogs, televisão, escolas etc. não é difícil concluir que muito, infelizmente, do que é dito, escrito e pensado por nossos alunos (e estamos falando de crianças, adolescentes e jovens) é atravessado de maledicência, de aspereza, de truculência e de depreciação para ficar nos adjetivos mais comportados.

No tratamento que dispensam, em grande parte, uns para com os outros, na maneira como muitos respondem (às vezes agridem) professores, coordenadores e diretores, nas palavras que registram em carteiras, cadeiras, portas e paredes, muros e fachadas, cadernos e livros... fica claro que universo de palavras os constituem. Um cenário bastante ruim, em minha opinião.

Certa vez estava saindo de uma das escolas municipais de Araçatuba e, ao entrar no carro, ouvi a seguinte frase de uma criança para outra: “Para com isso, sua desgraça.”. Fiquei chocado com aquilo porque nunca gostei desta palavra: DESGRAÇA. Sempre que a ouvia me incomodava. Não gostava de pronunciar e nem de ouvi-la. Parei o carro ao lado dos dois meninos e disse para que não repetissem mais aquilo.

Comentei num grupo de estudo no outro dia e minha amiga, diretora da Rede Municipal, Elis Avelhaneda, conseguiu me acalmar: “Antonio, pense em DEZ GRAÇAS!”. Ela nem sabe, mas me salvou! Arrumou um jeito de eu me relacionar com essa palavra. Hoje, sempre que a ouço penso em DEZ graças.

O exemplo é simples, por isso convidamos você a pensar nas palavras que tem ouvido e lido de seus alunos, quais palavras que os constituem, qual carga (se positiva ou negativa) predomina na formação dessas crianças.

É lógico que outras questões orbitam nessa, como a que formação estas crianças estão submetidas, a que condições sociais vivem cada uma delas, a que oportunidades tiveram acesso de leitura, de saberes, de palavras... É por isso que antecipamos no começo deste artigo que não seriam somente três perguntas que resolveriam o problema. Mas não cabem aqui serem discutidas. Não temos tempo para isso. A provocação é no sentido de constatação. Ou seja, precisamos oferecer um novo repertório de palavras para nossas crianças diferente dos que elas já têm.

Aí passamos para terceira (mas não última!) pergunta.

3. Quais provocações a escola pode fazer para que tanto professores quanto alunos sejam “formados” por um melhor repertório de palavras?

Na primeira pergunta deste artigo propusemos um primeiro olhar para a própria formação do professor, seu cotidiano com a leitura, com as palavras, o modus operandi utilizado por ele para se relacionar com os textos, principalmente os estéticos. Na segunda questão buscamos pensar um pouco sobre o universo da palavra no universo da escola, da vida do aluno e, a partir desses universos, estabelecer a relação entre eles. Nesta terceira questão estamos propondo uma PROVOCAÇÃO. Sim, porque entendemos que muito do que é bem feito nas escolas e salas de aula brasileiras é resultado de uma provocação, de um desafio.

Como diria Monteiro Lobato, “Livro é sobremesa: tem que ser posto debaixo do nariz do freguês.”. E o que é por “debaixo do nariz” se não uma provocação? Neste ponto envolvemos os vários personagens-participantes da escola: diretor, coordenador, professor, funcionários, gestores, pais de alunos, comunidade com um todo... no sentido de serem PROVOCADORES. Quais provocações temos feito com relação à palavra, à leitura?

O professor pode provocar o aluno com a palavra selecionando um livro, um poema ou qualquer outro texto (de preferência literário/estético/poético) para iniciar e/ou terminar a aula. Pode selecionar um dos dias da semana para fazer um “pique-nique literário” ou uma discussão a partir de textos de que alunos mais gostaram de ler durante o mês.

O coordenador pedagógico pode provocar professor e alunos discutindo projetos e propostas para o uso de cantos de leitura nas salas de aula, no uso da biblioteca, numa olimpíada de leitura ou no convite de avós ou pessoas da comunidade ao entorno da unidade escolar para contarem histórias para as turmas ou até mesmo alunos mais velhos contando histórias para os mais novos.

O diretor pode ser um grande provocador de leitura e de palavras ao comprar bons livros mensalmente a partir de lista apresentada por professores e alunos, na solicitação de verbas para construção, ampliação ou adequação de bibliotecas, salas de leitura, treinamento de pessoal, adequação de mobiliário etc. etc. etc. Pode, também, com coordenadores, professores e comunidade em geral, traçar ações e propor metas para a apreensão de habilidades e competências leitoras nos Planos Políticos Pedagógicos, nos Planos de Cursos, Planos de Aula e Semanários, nas discussões que fazem parte das HTPCs (Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo) e HTPPs (Horas de Trabalho no desenvolvimento de Projetos e Pequisas), ou seja, PENSAR e PLANEJAR ações de leitura que tenham vazão a curto, médio e longo prazo e que tenham METAS e PROPÓSITOS distintos para cada uma das séries que compõem a Educação Infantil e Ensino Fundamental contempladas em nosso Sistema Municipal de Ensino.

Como podemos observar, as provocações podem ser muitas e feitas pelas várias personas que (inter)agem com e na escola.

3.1 Algumas provocações literárias...

Como forma de dar o exemplo, sugiromos abaixo algumas obras e seus respectivos autores. São sugestões de gêneros variados e para os mais diferentes gostos (quem quiser provar de tudo, fique à vontade!). Claro que é somente uma provocação... Quão difícil para um leitor voraz sugerir títulos, autores, textos... Mas certamente aí vão algumas leituras que, sem dúvida, de algum modo irão seduzir quem quer que entre em contato com elas. Como deixa José Paulo Paes no subtítulo do livro É isso ali6, (outra provocação!) textos adulto-infanto-juvenis.

Pegue cada um deles. Leia-os saborosamente. Deguste cada uma de suas palavras, misture os sabores delas, forme novos sabores, coloque mais este ou aquele tempero, deixe gelar por um tempo (tem palavras e textos que precisam ficar um tempo “na geladeira” para serem saboreado de forma mais gostosa). Faça a sua sobremesa, coma-a, partilhe-a, coloque-a debaixo de muitos narizes!

Título/Autor/Editora


O menino que descobriu as palavras/ Cineas Santos/ Ática

Guilherme Augusto de Araújo Fernandes/ Mem Fox/ Brinque Book

É isso ali/ José Paulo Paes/ Salamandra

19 poemas desengonçados/ Ricardo Azevedo/ Ática

Dona Baratinha/ Ana Maria Machado/ FTD

Menina bonita do laço de fita/ Ana Maria Machado/ Ática

Uni, duni, tê/ Ângela Lago/ Moderna

O pequeno príncipe/ Antoine de Saint-Exupéry/ Agir

A casa sonolenta/ Audrey Wood/ Ática

Coração não toma sol/ Bartolomeu Campos de Queirós/ FTD

As palavras voam/ Cecília Meireles/ Moderna

A vida íntima de Laura/ Clarice Lispector/ Rocco

O tesouro na rua/ Cristovam Buarque/ Rosa dos tempos

Nós/ Eva Furnari/ Global

A fada que tinha ideias/ Fernanda Lopes de Almeida/ Ática

Um gato chamado gatinho/ Ferreira Gullar/ Salamandra

A terra dos meninos pelados/ Graciliano Ramos/ Record

O menino poeta/ Henriqueta Lisboa/ Global

Pode me beijar se quiser/ Ivan Ângelo/ Ática

Alice no País das Maravilhas/ Lewis Carroll/ Summus

A bolsa amarela/ Lygia Bojunga Nunes/ Casa Lygia Bojunga

O fazedor de amanhecer/ Manoel de Barros/ Salamandra

A moça tecelã/ Marina Colasanti/ Global

O homem que soltava pum /Mário Prata/ Caramelo

O batalhão das letras/ Mário Quintana/ Global

Cacho de histórias/ Eliardo França/ Mary e Eliardo França

O menino do dedo verde/ Maurice Druon/ José Olympio

Nó na garganta/ Mirna Pinsky/ Brasiliense

Reinações de Narizinho/ Monteiro Lobato/ Brasiliense

O fantástico mistério de Feiurinha/ Pedro Bandeira/ FTD

Viva a diferença/ Roberto Caldas/ Paulus

A galinha xadrez/ Rogério Trezza/ Brinque Book

Classificados poéticos/ Roseana Murray/ Nacional

O menino que quase virou cachorro/ Ruth Rocha/ Melhoramentos

33 ciberpoemas e uma fábula virtual/ Sérgio Caparelli/ L&PM Editores

O peru de peruca/ Sônia Junqueira/ Ática

Chora não...!/ Sylvia Orthof/ Atual

Cançãozinha e outros sons/ Tatiana Belinky/ Paulinas

Layla Terezinha/ Alvarenga/ Miguilim

A arca de Noé/ Vinicius de Moraes/ Companhia das Letras

A cortina da tia Bá/ Virginia Woolf/ Ática

Flicts/ Ziraldo/ Melhoramentos

É lógico que você precisará de algum tempo para ler todos estes livros. Mas, com certeza, você já provou de alguns deles, não é mesmo? Que sabor teve? Como foi a experiência? Você o partilhou com seus alunos ou com outros colegas da escola, da família, da sua relação de amizades? Como é dividir palavras gostosas? Palavras que fazem bem tanto para quem fala quanto para quem as ouve? Será que as crianças, adolescentes e jovens gostariam de ouvi-las? Será que depois também não irão partilhá-las? Dividi-las com suas famílias e amigos, com as pessoas de seu bairro? Será que quando precisarem resgatar e oferecer alguma palavra terão repertório para isso? Pensamos que sim.

4. Considerações finais

Quando tomamos consciência de que nossa relação com a palavra é algo corriqueiro e constante, também nos apropriamos da importância de se relacionar com ela (ou com as várias palavras que compõem nosso cotidiano) de forma mais profícua e corroborativa.

Pensar no espaço escolar (também) como um espaço privilegiado para o tratamento e uso de palavras a partir de textos que circulam nos bancos, pátios e outros ambientes escolares é dar condições para que os vários agentes educativos (gestores, professores, alunos, familiares etc.) se revistam de um repertório que ajude o outro, que o estimule à reflexão, que sensibilize para temas importantes a partir de universos distintos, de expectativas particulares, de experiências significativas etc.

Relacionar-se com a palavra sob múltiplas maneiras é também atender às necessidades comunicativas da própria língua: para cada situação um uso, para cada intenção uma seleção específica. Se possível, os textos de ficção e poesia, já que, a nosso ver, há pouco espaço (apesar dos avanços) ainda para eles e porque são os que mais dão espaço ao poder das palavras.

Dito de outro modo, propusemos ao longo deste artigo pensar na relação que mantemos com as palavras, inclusive e, até certo ponto, principalmente na escola, visto ser um dos poucos (e para alguns único) locais em que há oportunidade de se tratar deste tema, as possibilidades de uso da palavra.

Esperamos que as reflexões aqui levantadas sirvam, como indicado no começo, para provocar outras, para ampliar repertórios, para propiciar o diálogo (ou os diálogos) referentes ao tema e que, de forma muito prática e objetiva, partamos para AÇÃO.

5. Bibliografia

RIOS, Dermival Ribeiro. Minidicionário escolar da língua portuguesa. São Paulo: DCL, 1999.

CAMÕES, Luis Vaz de. Sonetos de Luis de Camoes. Lisboa: Assírio & Alvim, 2004.

BONDÍA, Jorge Larrosa. Pedagogia profana. Belo Horizonte/MG: Autêntica, 1999.

Referências:

1 Título baseado em verso do poema Romance LIII ou Das palavras aéreas, de Cecília Meireles, in: Romanceiro da Inconfidência, 1ª edição, Ed. Nova Fronteira, 2005.

2 Trecho do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, 1ª edição, LP&M Editores, 1997.

3 Versos do poema Meus oito anos, de Casimiro de Abreu, in: Casimiro de Abreu – obra completa, 1ª edição, Ed. G. Ermakoff, 2010.

4 Versos de Manuel Bandeira, do poema Vou-me embora pra Pasárgada, in: Manuel Bandeira – Poesia Completa e Prosa, 1ª edição, Ed. Nova Aguilar, 2009.

5 Referência a um termo cunhado pelo educador Paulo Freire quando dizia que as palavras deveriam ser semeadas pelo mundo, “mas não quaisquer palavras, mas as grávidas de mundo”, presente no livro Dicionário Paulo Freire – Danilo R. Streck (org.), 2ª Edição, Ed. Autêntica, 2008.

6 É isso ali, José Paulo Paes, 2ª edição, Ed. Salamandra, 2005.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

A ESCOLA E O SUPERMERCADO DOS PRAZERES

Fotografia: Felipe Zig

Por Maurício Guilherme Silva Jr.

Marcada pela incessante busca de sensações, a sociedade contemporânea costuma relacionar tudo aos movimentos e demandas do consumo. Diversas questões, no entanto, dizem respeito a lógicas humanistas, que ultrapassam os códigos econômicos e ressaltam a importância da diversidade e da diferença. Principalmente na educação, ressalta o professor da Universidade de Barcelona e doutor em Filosofia da Educação, Jorge Larrosa Bondía (foto acima), as experiências pessoais fazem com que a escola, "essa máquina aparentemente unitária", torne-se infinita.

Larrosa: a escola "escolariza" tudo o que toca

Como o senhor analisa o sistema educacional no mundo? Que países seriam modelos de educação?

Estudei com um sociólogo, na Inglaterra, que não entendia a existência de uma disciplina chamada "educação comparada". Ela sugere uma série de sistemas educativos espalhados pelos países. Este meu colega, no entanto, não via diferença em estar numa escola em Xangai, Buenos Aires ou nos Estados Unidos. A máquina escolar é semelhante em todos os lugares. Ao mesmo tempo, se você mantém-se atento a como as pessoas dão sentido a suas experiências escolares, percebemos que essa máquina, aparentemente unitária, é infinita. Não saberia dizer, pois, quais países são modelos de sistemas educativos. Eu acho que é tarefa de cada um achar seu próprio lugar e encontrar seus interlocutores. Hoje, você pode se entender melhor com pessoas que moram em outra parte do mundo. Ao mesmo tempo, pode não ter afinidades com as pessoas que moram próximas a você. O mundo é menor e, ao mesmo tempo, maior do que nunca.

Como os professores podem aliar, ao aprendizado formal, as leituras cotidianas de seus alunos?

É bom lembrar que, em alguns lugares do mundo, a leitura não faz parte do cotidiano das pessoas. Isso não é bom, nem ruim. Seria ruim sob o ponto de vista iluminista, segundo o qual a leitura é capaz de construir diferenças entre os homens. Em relação à forma como a escola trata as experiências de leitura das pessoas, eu diria que a instituição de ensino é um aparelho de recontextualização. A escola desloca textos de seus "lugares naturais", da produção e do consumo, e os põe em um território diferente. A escola "escolariza" tudo o que toca. Literatura, na escola, não se mantém literatura. Os preceitos escolares submetem tudo à sua dinâmica.

E quais as principais diferenças entre estudar e ler?

Na essência, não haveria qualquer diferença, já que a palavra "estudo" significa "leitura". O critério de diferenciação estaria, hoje, no prazer, na fruição. Se você observa os discursos pedagógicos sobre o ato de ler, quase todos insistem na ideia de que seria preciso recuperar, na escola, o lado lúdico e prazeroso da leitura. Mas pensar a escola como uma máquina de prazer é contraditório. Ao mesmo tempo, exigir que a leitura seja absolutamente prazerosa é também uma forma de simplificar as coisas. A ideia de sempre vincular a leitura ao bem-estar diz respeito a este mundo que se tem convertido numa enorme máquina de compra e distribuição de prazer. Imagine a escola tendo que competir com esse supermercado das sensações!

Como o senhor analisa o papel das novas tecnologias em relação ao futuro das práticas de leitura?

Em Dom Quixote, de Cervantes, o padre e outra personagem fazem críticas aos livros de cavalaria consumidos pelo povo. Para eles, tais obras não estariam à altura do que realmente deveria ser lido. Até hoje, as classes abastadas criticam as práticas de leitura, sob o ponto de vista do que consideram interessante a ser lido. Essa crítica está ligada, inclusive, às novas tecnologias. Neste caso, há uma divisão entre os apocalípticos e os integrados. Alguns acham que o livro e a ideia de memória e de tradição desaparecerão por força da cultura da imagem. Esse é o discurso apocalíptico. De outro lado, há aqueles que veem as novas tecnologias como solução para o mundo. Não acredito em nenhuma das duas ideias. Tudo, na verdade, está submetido a uma série de controles políticos, ideológicos e morais.

Mas não seria prejudicial o acesso diário a um grande volume de informações?

Isso remonta à ideia de que a leitura é uma prática lenta, isolada, silenciosa, demorada e que constrói um tempo diferenciado do ritmo cotidiano. Trata-se de um imaginário de leitura que, na verdade, nunca existiu. Contudo, as tecnologias realmente têm mudado a relação das pessoas com o tempo. Para uma pessoa como eu, que dedicou boa parte da vida ao estudo da leitura, seria de se esperar um discurso contra a internet e a favor da cultura do livro. No entanto, talvez a cultura do livro nunca tenha sido o que as pessoas imaginaram.

O que pode ser feito para ampliar a relação entre arte e educação?

A relação da educação com a arte, desde os gregos, é constitutiva. Educação é inconcebível fora da cultura de seu tempo. Além disso, os processos educacionais são pensados como arte, e não como técnica. Portanto, a pergunta sobre como relacionar arte e educação, na essência, não tem sentido. Mas hoje a questão ganhou significado porque essa relação não é mais tão clara. O cinema, por exemplo, faz parte da cultura de nosso tempo. Seria impensável, pois, uma teoria educativa que não considere a sétima arte como algo importante. Educação, em resumo, precisa se relacionar com a cultura do presente. Do contrário, transforma-se em prática de adestramento.


* JORGE LARROSA BONDÍA é doutor em pedagogia pela Universidade de Barcelona, Espanha, onde atualmente é professor titular de filosofia da educação. Publicou diversos artigos em periódicos brasileiros e tem dois livros traduzidos para o português: Imagens do outro (Vozes, 1998) e Pedagogia profana (Autêntica, 1999).

domingo, 16 de janeiro de 2011

600

Antonio Luceni

Outro dia escrevi aqui sobre os problemas que vários municípios enfrentam quando este período de chuvas chega. Sem mesmo presumir o terrível mal que assolaria nossa nação, já via coisas tristes.
Falei da minha experiência com as goteiras de minha casa sobre minha cabeça e de meus familiares. Disse também das noites quase-dormidas à mercê da chuva. Comentei sobre os sapos que tínhamos que chutar para atravessar a rua de casa alagada e dos dias trabalhados com as roupas encharcadas.
Triste, é verdade. Mas nada comparado com o que estamos ouvindo e vendo nos últimos dias. E aquele salvamento daquela mulher sobre a laje de sua (ex) casa? Coisa triste, não? Salva por uma corda improvisada, a partir da dedicação de dois vizinhos dispostos e corajosos. E aquele bebê de apenas seis meses de idade que ficou soterrado por mais de doze horas? Saiu assustado, impressionado com tudo aquilo, mas sem chorar, sem dimensionar tudo o que estava acontecendo, inclusive consigo mesmo.
Entre tantos outros casos igualmente marcantes para nós e, principalmente, para os sobreviventes e para os familiares dos mortos. (Corpos sendo enterrados às dezenas, em valas comuns, nos quintais de suas próprias casas).
Na primeira entrevista dada pela presidenta Dilma à impressa, disse uma frase com a qual concordo em gênero, número e intensidade: “No Brasil, a construção irregular não é exceção, mas a regra”. Por esse motivo que no artigo da semana passada afirmei que enchentes eram um assunto, entre outros, de questão política.
Lógico. O planejamento de uma cidade deve ser cuidado por seus gestores. Iluminação, esgoto, pavimentação, poda, limpeza de terrenos abandonados, adequação e uso de solo etc., etc. etc... E isso não é um problema deste ou daquele município. De modo geral, todas as cidades fazem vistas grossas para estas questões. Até ocorrerem fatos como os que estamos presenciando.
E podemos acrescentar à inércia de ações governamentais outros episódios sociais nocivos como a dengue, invasões de terras produtivas, o analfabetismo, a calamidade na saúde e segurança públicas da grande lista que poderíamos fazer aqui. Não são assuntos fáceis, é verdade, mas precisam ser encarados.
Também uma ideia louca, mas nem por isso inviável, me veio nos momentos em que eu pensava sobre esse assunto: por que os senadores, deputados e vereadores dos estados e municípios atingidos pelas chuvas não abrem mão de três ou quatro meses de salário e utilizam do dinheiro que recebem para construção de casas populares aos desabrigados da chuva? Não resolveria o problema, mas certamente faria diferença para as famílias que fossem contempladas. Melhoraria um pouco a imagem de nossos políticos e fariam jus ao gordo aumento que tiveram. Assistencialismo? Não. Coerência. (Para quem pensa que os referidos políticos ficariam sem salário, engano. Muitos deles têm o cargo político como uma “profissão” paralela).
O que tem de 600? O número aproximado de mortos até o momento. Mas não são apenas um número, não. São vidas que deixam saudades e um rastro de amizade, um cheiro na camisa, uma risada inimitável entre tantos outros gestos na memória dos que ficam.

Antonio Luceni é escritor e Coordenador Regional da União Brasileira de Escritores – UBE.

domingo, 9 de janeiro de 2011

TRAVESSEIRO ENCHARCADO

Antonio Luceni

Todo início de ano é a mesma história: enchentes para todos os lados e, com elas, desabamentos, mortes, soterramentos... E não são somente físicos, não; metafóricos e psicológicos também.
Com as chuvas, desabam sonhos e inundam corações de tristeza.
Convivi por muitos anos com uma maldita goteira que ficava sobre minha cama, especificamente sobre meu travesseiro. Ela pingava e eu acordava. Desviava a cabeça do lugar ou dormia no lugar dos pés, torcendo para noite acabar. No outro dia trocava a telha, mas não adiantava: ela surgia novamente do nada.
Do nada, não. É que a casa era coberta por três ou quatro tipos de telhas romanas. Resultado de uma troca que meu pai fez na ocasião para cobrir a casa: um rádio velho por as tais telhas. Até hoje estão por lá.
As chuvas desabam e, com elas, encharcam sonhos. Quantas vezes eu, meus irmãos e meus pais saímos debaixo de chuva para trabalhar e estudar. Atravessávamos a rua Santo André inteira, desde a travessa Sérgio Cardoso até a avenida Prestes Maia, em Araçatuba, a pé, chutando sapos e com lama até as canelas. Trabalhávamos ensopados ou, pelo menos, molhados da cintura para baixo.
Certa vez, uma calha foi rompida na cozinha de casa em meio a um temporal e ficamos com um “chafariz” natural bem no meio da área de serviço, sem poder fazer nada, além de pegar um rodo e tentar expurgar ao máximo a água para fora.
Perdermos vários móveis entre sofás, guarda-roupas e colchões por conta das chuvas em excesso. A seca é ruim, é verdade. A poeira irrita a garganta, bota fama às donas de casa de relapsas, suja os colarinhos das camisas... Mas as águas do exagero são bem piores e, talvez, a maioria de vocês, amigos leitores, não sabe o que é isso. Acreditem: é algo triste.
Fico vendo e lendo essas notícias todas pela tevê, jornal e internet sobre os desabrigados e vitimados da chuva e retomo os dias ruins pelos quais passei na adolescência e parte da vida adulta. Cada vez que escuto sobre os encharcados das chuvas fico matutando num modo viável para poder ajudar.
Aquela goteira que me incomodava sobre meu travesseiro ainda me acompanha. Agora, batendo sobre minha consciência e, ao mesmo tempo, fazendo com que eu também me desperte com relação a esse tema – vítimas das chuvas – que, para muitos (sobretudo os que não sofrem com enchentes) não significa muita coisa.
Mais uma vez essa discussão passa pelas questões políticas e sociais. Há que se pensar nas vítimas das chuvas antes mesmo de que estas assim sejam conhecidas. Depois, não vale a pena chorar o travesseiro encharcado.
Quem tem coragem pra isso?

Antonio Luceni é escritor, Coordenador Regional da União Brasileira de Escritores – UBE.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

ANO NOVO, VIDA NOVA!



Antonio Luceni
aluceni@hotmail.com

Quando em agosto do ano passado começamos a organizar aquele que foi o primeiro evento da União Brasileira de Escritores – UBE em nossa região, o 1º Encontro de Escritores Independentes de Araçatuba e Região – ENESIAR, várias parcerias foram efetivadas. Uma delas com a Folha da Região.
A Folha fez a cobertura de todo o evento, participando efetivamente com seus profissionais numa das mesas de discussão e, gentilmente, presenteou o Núcleo UBE com esta coluna. Não precisamos dizer que ficamos muito alegres, isto porque todo escritor quer ter seus textos publicados e não servindo de alimento para traças.
Pois é, a partir dessa semana os amantes das letras, da leitura e da literatura poderão acompanhar um pouco das ações da União Brasileira de Escritores, além de textos de caráter estético, por meio de seus associados, neste espaço.
Estarão presentes nestas linhas resenhas e críticas de livros literários, poemas, crônicas, contos, artigos técnicos de nossos associados e/ou de autoridades ligadas à União Brasileira de Escritores em âmbito nacional, além de novidades no campo da literatura e do livro.
Esperamos que, com esse trabalho, a literatura, bem como muitas das questões que orbitam a ela, seja fortalecida em nossa região e entendida como algo imprescindível à condição humana, como bem lembra Antonio Candido nos livros “Direito à Literatura” e “Literatura e Sociedade”.
Aproveitamos a oportunidade, também, para convidar a todos os escritores da nossa região para que se mostrem e que entrem em contato conosco, a fim de criarmos uma rede literária na região noroeste do estado de São Paulo. Encaminhe um e-mail com seus dados (nome completo, profissão, cidade e e-mail para contato) e receba notícias sobre as atividades da UBE (concursos literários, coletâneas de texto, cursos e palestras etc.).
Gostaríamos, aqui, de agradecer publicamente à Diretora Presidente da Folha da Região, Ana Eliza Lemos Senche, pela oportunidade que nos foi dada e pelo apoio à divulgação da palavra impressa. Este gesto traduz parte do respeito e da seriedade com que tão importantes instituições – a Folha da Região e a União Brasileira de Escritores – têm para com a veiculação de textos da mais alta qualidade e que contribuem para que seus leitores tenham um senso crítico e visão de mundo mais apurados.
Enfatizamos, ainda, que esta coluna é voltada para todos os associados da União Brasileira de Escritores em nossa região. Por esse motivo, os associados que desejarem publicar seus textos neste espaço devem acessar o blog: www.blogdaube.blogspot.com e lá obter todas as informações de que necessitam para fazê-lo. Críticas e sugestões sempre serão bem recebidas. Deixe suas impressões e comentários no blog e, dentro das possibilidades, elas serão absorvidas e abordadas neste espaço.
No mais, o que queremos é fazer com que o máximo de pessoas sejam melhoradas a partir da literatura, da palavra. Vamos, juntos, fazer de nossa região uma região de leitores.
Um feliz 2011 para todos.

Antonio Luceni é escritor e Coordenador Regional da União Brasileira de Escritores – UBE.

domingo, 2 de janeiro de 2011

PERU DESFIADO

Antonio Luceni

Pegam-se as partes, desfiam-se todas, acrescentam-se novos ingredientes como salsinha bem picada, cebola, alho, pimenta calabresa, sal a gosto e... pronto. É só misturar bem tudo, levar ao forno e deixar aquecer por aproximadamente trinta minutos. Depois é só servir com uma salada de legumes e arroz branco.
Já não aguentava mais aquela criatura enchendo o saco com receitinhas de mau gosto. Tudo bem que a moda agora é aproveitar tudo, reciclar as coisas, mas comida? E ainda por cima um trem ruim que doía. Eu não, gosto de comer direito. Pelo menos isso, não é mesmo? A gente já não tem o carro que queria, a casa com os móveis desejados, a viagem do sonho sempre adiada... mas comida, não. Teria que ser de primeira categoria.
A árvore já estava sendo desmontada, os enfeites e penduricalhos devidamente guardados, as capas de almofadas, as toalhas de mesa, castiçais e velas sobressalentes... tudo era embrulhado para ficar mais um ano à espera das entusiasmadas mãos que os desembrulhariam no final daquele ano.
As visitas desocupavam a casa (algumas fariam falta, outras, nem tanto), tudo retomava o ritmo de antes e a normalidade entediante, mas de algum modo desejada, seria renovada fazendo parte de mais um ano que se iniciava.
Teria que ouvir as mesmas frases e comentários dos amigos de trabalho. Teria que rever o velho chefe com a tromba mais comprida do mundo, como se fosse culpado por ter férias, décimo terceiro salário, feriados mil...
Será que saberia como operacionar o computador novamente? Será que seus clientes ainda o estariam esperando? Estava com uma vontade louca de que alguns tivessem mudado de fornecedor. Coisa chata ter que lidar com alguns deles.
— Pedro, acorda... sai daí. Deixa eu limpar o sofá, anda.
— Quê? Quê que foi?...
Nem poder fazer suas ilações era possível. Não sabia o que era pior: se ficar em casa suportando a patroa ou se no serviço o patrão.
— Essa coisa de feriado é como encher a cara. Quando começa é bom, mas depois para aguentar a ressaca...
E ficou pensando em tudo, em coisas banais, em preguiças, em desejos impossíveis, em coisas exequíveis e outras nem tanto, em coisas dizíveis e em outras jamais pronunciáveis.
— E esse desfiado horrível de peru, já tá pronto?

Antonio Luceni é escritor, Coordenador Regional da União Brasileira de Escritores – UBE.