*Graduando em Arquitetura e Urbanismo pela Mackenzie |
“Uma região pode desenvolver ideias. Uma região pode aceitar ideias. A imaginação e a inteligência são necessárias para ambas as coisas.”
Kenneth Frampton – História crítica da Arquitetura Moderna
Na história da arquitetura, o edifício passou por diversas abordagens com relação à cidade. Mais especificamente, no movimento moderno, que teve seu auge na primeira metade do século XX, a indiferença do edifício com relação ao lugar era uma das marcas mais latentes. Para ilustrar, podemos usar o exemplo de Brasília. Como uma cidade modernista por excelência, a capital do País e seus edifícios são elementos que pouco se relacionam com o local. Com exceção do só seu desenho urbano em forma de avião, que parece nascer a partir do desenho do lago, Brasília poderia ser uma cidade em qualquer outro lugar do mundo, sem perder suas características principais. Assim também são seus prédios. Os edifícios modernistas possuem uma linguagem universal e se estivessem em Nova Iork, Luanda ou Araçatuba, continuariam a ser o mesmo prédio.
Não é por acaso que, muitas vezes, essa arquitetura é referida como “Estilo Internacional”. Oscar Niemeyer, Le Corbusier, Mies Van der Rohe são alguns dos principais arquitetos deste movimento. Em contrapartida, diante da ação dos modernistas, surgiu uma corrente da arquitetura muito divulgada pelo crítico americano Kenneth Frampton que chama-se Regionalismo Crítico. Esta abordagem da arquitetura, pretendia minimizar a indiferença do edifício com relação ao lugar que este ocupava. Através de propostas mais contextualizadas às identidades locais, os edifícios propunham-se em significar sua arquitetura com elementos da cultura do local inserido.
Um dos exemplos do regionalismo crítico, é a Igreja Bagsvaerd de 1976, em Copenhague, do arquiteto dinamarquês Jørn Utzon, na qual usa elementos pré-fabricados de concreto – de valor universal – para “envelopar” o edifício, combinados de modo particularmente articulado, com abóbadas de concreto armado moldadas no local – com valor um tanto regional. Neste movimento, que precede o pós-modernismo, outro fator importante consiste na atenção dada para os materiais locais, o artesanato e as sutilezas da luz local e na topografia como ela se apresenta.
Interior sob outra iluminação |
No último texto publicado nesta coluna, falamos sobre Zaha Hadid. Apesar da arquiteta não ser um nome do modernismo, sua arquitetura não pretende construir relação com o local. As formas e materiais são elementos indiferentes e podem ser aplicados em qualquer situação e contexto. Poucas são as referências culturais locais. Podemos interpretar o Regionalismo Crítico como uma prática marginal que, ao mesmo tempo em que se recusa a abandonar aspectos progressistas da tecnologia, adverte a arquitetura descontextualizada que privilegia a estética (Zaha Hadid) e a cultura dominante tão modernizada. Contra a tendência da ‘civilização universal’ que privilegia o ar-condicionado, fazem da luz, do terreno, das condições climáticas, as bases que sustentam o projeto. Fazem do aspecto visual uma característica secundária, na medida em que enfatizam o táctil, as diferentes temperaturas em ambientes distintos, assim com o aroma, os sons, a ventilação e até mesmo o acabamento dos pisos e paredes que são convites ao tato.
Essa abordagem não é um discurso tão somente visual e estético. É a priori, um discurso crítico cultural e social. É um vocabulário que repreende o que é internacional e valoriza as sensibilidades, os costumes, a consciência estética, a cultura diferenciada e as tradições sociais. É uma arquitetura de resistência que pretende significar algo que ultrapassa o universalmente belo e alcança o culturalmente singular.