terça-feira, 9 de abril de 2013



Li sobre este texto no Estadão de ontem e gostaria de dividi-lo com vocês. Primeiro porque "O pequeno príncipe" é um dos meus livros preferidos; depois, porque a Marina Colasanti é uma de minhas escritoras prediletas e, por último, porque ela reconstitui de forma genial o texto de Exupéry em seu próprio texto.

O Reinado do Doce Príncipe
Marina Colasanti


Desenha um Príncipe para mim?
Eu não sei desenhar um Príncipe?
Ora, qualquer um sabe desenhar um Príncipe.
Então muito bem, aqui está o seu Príncipe.
O que é isso que você desenhou?
É um livro. E dentro do livro mora um Príncipe.
De que tamanho?
Pequeno. Pouco maior que uma rosa grande.
E o pequeno príncipe que mora no livro e que se apaixona por uma rosa rodou o mundo, um mundo bem maior que o planeta dos baobás que ele havia deixado um dia. E as crianças amaram o pequeno príncipe, e os adultos amaram o pequeno príncipe, e as misses amaram o pequeno príncipe. E o amor das misses foi a sua ruína.
A dele era uma história meiga, que dizia com doçura coisas de bem querer que todos podiam entender. As misses também entenderam, aquelas misses que não eram moças de verdade mas símbolos de uma beleza à qual não se concede inteligência. E então todos acharam que, se o pequeno príncipe era tão fácil de ser amado, nada valia. E deixaram de amá-lo
Eu o protegi em mim com uma redoma de vidro. Para que os ventos maus não o atingissem. Pedi que se envolvesse naquele manto azul dele, que enrolasse a écharpe ao redor da garganta, porque sei o quanto é delicado. E deixei que a cobra deslizasse nas imediações. Afinal, são velhos companheiros de viagem.
Só me lembrei dele dia desses, por causa do seu aniversário. Peguei o livro na estante, abri, e lá estava o meu príncipe despenteado e improvável, de botas altas. Continuava menino, com aquela transparência de criatura nova. E ainda amava a rosa e conversava de amor com a raposa.
O que ele dizia tinha a mesma beleza de antes. A mesma beleza enternecedora que tem toda a sua história escrita por um aviador que um dia, como sua personagem, se viu sozinho no deserto e olhou as estrelas e soube que a vida e a morte são fragmentos de um mesmo percurso. Que fosse fácil de entender era apenas mais um sinal do acerto dessa parábola que, como todas as verdadeiras parábolas, não se dirigia a ninguém em particular, mas queria dialogar com todos.

Marina Colasanti é autora de contos, crônicas, ensaios e poemas, ganhou o concurso de contos para jovens instituído pela Unicef e o prêmio Jabuti de Livro do Ano, em 1994, com Ana Z., aonde vai você?

Nenhum comentário:

Postar um comentário