sexta-feira, 23 de agosto de 2013

O que acontece em Bauru, fica em Bauru!

*Graduando em Arquitetura e Urbanismo pelo Mackenzie
Réplica da estátua colocada pela loja Havan. Foto: Folha de S. Paulo
Recentemente li uma reportagem na Folha de S. Paulo sobre uma estátua que foi colocada em frente a uma famosa loja de departamentos que, por acaso, já foi tema de discussões dessa coluna. Na matéria, datada em 05 de agosto desse ano, moradores da nossa cidade vizinha Bauru, protestavam contra a colocação de uma “estátua da liberdade” em frente a loja Havan. Mas antes de qualquer comentário sobre o acontecido, vamos esclarecer três coisas.

Primeiro: não existe qualquer crítica contra a marca Havan. Esta postagem não é endereçada à empresa, aos produtos, muito menos aos funcionários da loja. Segundo: este texto também não se opõe a estátuas, monumentos ou esculturas gigantes. Acredito que estes elementos, em contextos certos, podem agregar muito valor à paisagem urbana. Também não trata de discutir juízo de valor. A estátua da liberdade é uma obra de arte, e ponto. Terceiro: por mais que eu tenha ressalvas à cultura americana, este texto também não é um manifesto político. Trato aqui somente da questão da arquitetura. Isso posto, podemos seguir a reflexão sobre o fato.

Não bastasse o mal gosto do próprio edifício, a Havan agora quer aumentar o estrago enchendo a cidade de souvenir gigante. Essa intervenção, como educadamente eu vou me referir, além de não ter qualquer propósito, não contribui em nada para a paisagem urbana. A construção de cenários e simulacros urbanos já é bastante problemático por si só, mas quando o fazemos com signos que nada têm a ver com a realidade local, isso se torna excessivamente problemático.

Na matéria que mencionei, os moradores indignados fizeram um abaixo-assinado para que a prefeitura tome providências diante dessa intervenção. Com toda a razão, eles temem que a imagem da cidade seja confundida com a réplica da estátua."Quando me deparei com aquela réplica gigantesca, na minha opinião de mau gosto, descaracterizando e chamando toda a atenção na entrada da cidade, senti um certo constrangimento", disse o advogado Fabio Galazzo.

Alguém pode me responder o que os bauruenses têm a ver com uma réplica do pelo presidente francês ao governo americano? O que isso significa para a população local? E se o hipermercado ao lado da loja resolver erguer uma réplica da Torre Eifel? E se o teatro em frente resolver erguer uma esfinge em tamanho real? E se o prefeito resolver construir um Cristo Redentor em qualquer rotatória pela cidade?

Nós estamos falando de uma cidade! Isso não é uma "mesa de centro da sala da vovó" onde a gente põe os retratos, o vaso com flor, o souvenir, o artesanato da netinha etc... Para mim, isso tudo tem a ver com o que nós já discutimos em outra publicação. São os signos de prestígio que alguns empreendedores nos empurram, na tentativa de nos convencer de que tal edifício não é qualquer edifício. Esse jogo forçado, põe os desinformados a acreditar que, ao comprar em lugar que tem uma Estátua da Liberdade na frente, passam a pertencer a um extrato social elevado, rico, americanizado. É a sensação de participar do universo do consumo. Essa atitude dos empreendedores é, no mínimo, desonesta, pra não dizer antiético.

Eu lamento por Bauru estar passando por isso. Torço para que nossos vizinhos consigam eliminar essa intervenção da paisagem da cidade. Mas temo mais ainda que essa moda se espalhe e chegue até Araçatuba. E ainda sem entender muito, eu me pergunto: de duas, uma: ou nossas cidades viraram a Disneylândia, ou mudaram o nome da cidade de Bauru para Las Vegas. 

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